“Se vivemos pelo Espírito, andemos também de acordo com o Espírito”. (Gal. 5,25) Assim como a Santíssima Trindade, Deus Pai, Filho e Espírito Santo formam uma unidade desde sempre e para sempre, tudo está interligado, desde os primórdios da história da humanidade, nada acontece ou existe ao acaso. “Para tudo há um tempo, para cada coisa há um momento debaixo dos céus: ...” (Ecle 3,1-8). Os dias correm numa velocidade tamanha que, presos no emaranhado do cotidiano, rapidamente nos esquecemos das lições que a história, ‘mestra da vida’, nos ensina. A humanidade, que vivia imersa como que em uma cápsula de segurança, de repente percebeu que um vírus invisível, de forma rápida e violenta, rompeu essa sensação de poder e saber, revelando a fragilidade e as incertezas humanas, como também obrigou, por conta do isolamento social, a volta da convivência mais próxima entre os núcleos familiares. Essa proximidade repentina dentro do núcleo familiar, de certa forma, gerou um novo aprendizado e aprimorou o conhecimento mais íntimo entre os membros, a colaboração mútua, enfim, coisas boas e alguns conflitos inevitáveis, mas todos puderam perceber o real conceito de família. O homem deu-se conta da fragilidade da vida quando percebeu que não tinha sequer o direito de despedir-se dignamente de seus mortos, e que, sem velório, não haveria o último adeus. Esse confronto inesperado com a morte sem adeus gerou medo e ao mesmo tempo, deveria pelo menos, ter gerado um voltar-se para novas atitudes de demonstrações de afeto e carinho em vida, valorizando cada pessoa, amando mais, perdoando mais, demonstrando mais afeto e carinho; seria isso o natural depois de tanto sofrimento. A partir deste momento de parada obrigatória, muito se ouviu dizer que, depois deste flagelo pandêmico, o modo de vida seria diferente, que o ser humano seria capaz de rever atitudes e recomeçar, a partir da pandemia, numa convivência mais fraterna e solidaria. Vivendo hoje o período pós-pandemia, as lições aprendidas, as perdas irreparáveis e os danos irrecuperáveis, vemos a humanidade voltando ao frenético corre-corre, ao individualismo, deixando para trás as “lições da história” tão recentes e marcantes. Em sua Carta Encíclica “Todos Irmãos” (Fratelli Tutti), o Papa Francisco aborda de forma clara e muito sábia, a urgência de que o homem redescubra que todos somos devedores e necessitados uns dos outros, como nos ensinou tão claramente a pandemia, ou seja, EM DEUS, SOMOS TODOS IRMÃOS. Irmãos que, antes de ter o próprio núcleo familiar, provém do mesmo Pai, Deus, o Criador de todas as coisas, de quem viemos e para quem vamos voltar. Irmãos que foram salvos pelo Sangue Redentor de Cristo e banhados em Sua Misericórdia no alto do Calvário, pendente numa Cruz! Irmãos selados, marcados com o mesmo e único Espírito Santo que santifica, une e encaminha para uma convivência mais fraterna e respeitosa, para que todos possam convergir para o caminho da salvação. Entendendo essa verdade, o espírito mundano do salve-se quem puder, dará lugar à amabilidade da mão estendida, dos braços abertos, da partilha e da luz que somente quem se deixa guiar pelo Espírito Santo consegue emanar. Há dentro do homem uma luta diária entre o bem e o mal, entre o desejo de Deus e a tentação do maligno e, bem o sabemos, vence aquele a quem alimentamos. Daí a necessidade de estarmos sempre abertos à ação do Espírito do Santo e aos seus abundantes frutos: brandura, temperança, bondade, afabilidade, paciência, fidelidade e alegria; quando um coração se permite inundar com esses frutos, o mal não consegue lugar. Comecemos em nossa família, exercendo a virtude da escuta carinhosa, da compreensão do outro. Quantas vezes os conflitos acontecem por coisas tão banais, apenas por que todos querem ter razão. Opiniões e gostos divergentes devem servir para o crescimento, não para o distanciamento. Se aprendermos isso em nossa família, saberemos levar ao local de trabalho, na escola, nos clubes, na vizinhança, enfim, no mundo. Não estamos no mundo para dividir, isto quem deseja é o inimigo de Deus, o maligno. Deus nos fez irmãos, para juntos, todos, sermos um com Ele, como Ele o é com Cristo. Certamente, se guardássemos em nosso coração tantas coisas que deixamos escapar de nossos lábios, nós e quem vive ao nosso redor, seríamos poupados de muitas ofensas, mágoas e separações assim como pecaríamos muito menos. Que Maria Santíssima nos ajude a calar e guardar muito mais coisas no silêncio de nosso coração, e quando isso estiver nos sufocando, que consigamos entregar, silenciosamente em forma de prece, ao Coração de Jesus, que tudo sabe e acolhe. +Dom Carlos José Bispo da Diocese de Apucarana - Paraná